ENQUADRAMENTO

Joaquim Martins Lampreia defende que “o Lóbi não é mais do que um subproduto da Democracia”, permitindo a “transparência” exigida pelo pluralismo e liberdade, enquanto pilares das sociedades democráticas.

Susana Coroado, investigadora, considera que os efeitos positivos da regulação do Lóbi, para a democracia, só serão atingidos se for garantida “a transparência dos processos decisórios e a igualdade de acesso a esses processos” (Coroado, 2017).

Na Assembleia da República discute-se, neste momento, um enquadramento regulador da atividade, todavia, falta o debate público e é para este que pretendemos contribuir.

Opções discordantes acerca do lóbi

Em Portugal, está em “cima da mesa” a possibilidade de legalizar o lóbi, tornando-o numa atividade regulamentada e regulada a breve prazo (Lopes, 2020).

Esta alteração está no meio de duas opções discordantes em que uma defende que esta atividade nunca deverá ser legislada, pois é legitimar um meio por onde se faz corrupção. Este polo que é contra a regulamentação do lóbi, considera esta atividade um meio de promoção de interesses “pessoais” em detrimento do direito de outros.

Por outro lado, existe um outro polo, com uma perspetiva completamente oposta, que defende que “influenciar e defender interesses particulares ou corporativos existe e existirá sempre” (Batista, 2020).

Segundo Filipe Batista (2020), pode-se continuar a ignorar a realidade desta atuação ou por outro lado pode-se definir fronteiras e modos de atuação, através do esforço da sua regulamentação e clarificação de quem, como e de que forma a exerce, na influência das tomadas de decisão.

Nesta temática é muito comum falar-se no “lado bom e lado negro da força”. O “lado negro” pode revelar-se pela execução de esforços na influência do impedimento de várias faixas da sociedade intervirem nos processos democráticos que através da legitimação influem a decisão política. O “lado bom”, por exemplo surge na defesa dos direitos e interesses de grupos da sociedade que lutam pelos seus direitos.

Nas palavras de Filipe Batista (2020), isto é apenas uma questão de “transparência versus opacidade e legalidade versus ilegalidade”.

André Ferreira
Miguel Andrade
Luís Correia

Referências bibliográficas

Batista, F. (2020). Lóbi, para que te quero? Jornal I. https://ionline.sapo.pt/artigo/665409/lobi-para-que-te-quero-?seccao=Opiniao_i

Lopes, M. A. (2020). Lóbi vai avançar em 2020 mas ainda levanta dúvidas – TSF. https://www.tsf.pt/politica/lobi-vai-avancar-em-2020-mas-ainda-levanta-duvidas-10726438.html



Lóbi em Portugal – Que Futuro?

Imagem: Hemiciclo do Parlamento Europeu- Bruxelas

Bruxelas é a capital europeia do lóbi, apenas sendo ultrapassada por Washington à escala global. Em Junho de 2020, estavam inscritas cerca de 11.700 entidades no EU Transparency Register, registo de transparência pública da Comissão Europeia.
Destes, mais de 6200 são lóbistas e associações profissionais de Lóbi, e mais de 3200 são ONG´s.

Todos os Estados-membros do Norte e Centro da Europa Comunitária estão ajustados a esta dinâmica de relacionamento e, em todos, a atividade de lóbi tem vindo a crescer nos últimos anos.

Em Portugal, o lóbi não existe oficialmente. É visto com desconfiança, encarado com sentido pejorativo e intimamente ligado à noção popular de “cunha” ou “compadrio” ou ao tráfico de influências e à corrupção.

Sobre isto, Joaquim Martins Lampreia, o primeiro português acreditado lobista em Bruxelas, e que defendia como“essencial” a regulamentação do lóbi em Portugal, referiaque o país “ainda está na democracia antiga”, para, a seguir, deixar a questão: “Não é de estranhar que o nosso país seja atualmente o menos competitivo junto das instâncias comunitárias?”.

A AR preparou o Projeto de Lei 1053/XIII, relativo à “regras de transparência aplicáveis a entidades privadas que realizam representação legítima de interesses”.

A 12 de Julho de 2019, o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa vetou este diploma, por o considerar insuficiente, nomeadamente no que respeita:

1. Ao registo de todos os interesses representados;
2. À omissão dos proventos recebidos pelo registado;
3. E principalmente a omissão, no âmbito da aplicação do Decreto, da sua aplicabilidade ao Presidente da República, às suas Casa Civil e Casa Militar, bem como, aos representantes da República nas Regiões Autónomas.

A 20 de Janeiro de 2020, o PAN sugere a criação de novas regras de transparência aplicáveis às interações entre entidades públicas e outras entidades com vista a regulamentar o lóbi.

Em Portugal faz-se lóbi como se faz na maioria dos países democráticos? Quem são os gestores dos interesses nacionais, fora e dentro de Portugal? Quem ganha com a regulamentação em Portugal das leis da transparência e quem perde com a representação legítima de interesses?

Imagem: Jens Galschiot – Man on a Bench. Parlamento Europeu, Bruxelas


Créditos de Imagem: Adelaide Modesto

Adelaide Modesto
João Moura Ferreira
Micaela Neves

A nossa visão sobre o Lóbi

Lóbi palavra turva e maldita geradora de incómodo entre governantes e governados. É esta a imagem do Lóbi, em Portugal, muito associada a práticas muito nebulosas e pouco ou nada legítimas.

Assunto tabu devido à fraca clareza do conceito e à sua carga negativa, que por si só, geradora de olhares desconfiados pela sociedade civil. A sua conotação pejorativa é também associada muitas vezes a actividades criminosas, obscuras, práticas ilícitas, pouco claras e transparentes. Há assim, obviamente, uma necessidade urgente de esclarecimento do termo, que é de grande sensibilidade, e de regulamentar a actividade em Portugal.

Em democracia a política tem duas faces: uma institucional, caracterizada por leis, eleições, princípios, procedimentos, órgãos de poder, programas e que coloca os partidos e os grupos de interesse no centro do sistema de representação e outra informal, caracterizada por formas de influência encobertas, nomeadamente, tráficos de influência, com falta de enquadramento legal e transparência. O Lóbi está entre
estes dois mundos e levado com ética e integridade é um caminho legítimo, permitindo aos grupos de interesse a sua envolvência em decisões que os podem também afectar!
A questão é que este tema ainda nem sequer chegou ao debate público.

É esta inexistência de regulamentação que torna a avaliação da intensidade e âmbito das práticas de Lóbi difíceis de avaliar e não reconhecidas.

Para o público em geral continua a ser um mistério e uma actividade controversa, obscura, e onde a palavra Lóbi assume mesmo uma conotação muito negativa. Porque a indústria do Lóbi e da representação de interesses no nosso país, é ainda incipiente.
Acresce também que em Portugal não há tradição lobista e, oficialmente, o Lóbi não existe! Muito pela pouca explicação dada à causa e também por falta de vontade política. Porém, nos últimos anos, esta conotação negativa parece estar a perder força, e a desbravar terreno, muito também pela acção do próprio amadurecimento da
sociedade civil. Ao contrário do que acontece nos Estados Unidos onde o Lóbi é um quinto poder, e a sua actividade profissionalizada e corrente, fazendo mesmo parte do exercício da política americana.

Por sua vez, na União Europeia, onde Bruxelas é designada como a Capital Europeia do Lóbi, foi lançado, em 2011, o Registo de Transparência. Trata-se de uma iniciativa conjunta da Comissão e do Parlamento Europeu destinada a tornar os processos de tomada de decisão mais abertos, com imposição de limites éticos, salvaguarda de regras das suas actividades, e acessíveis para todos os cidadãos.

Trata-se de ajudar a assegurar a transparência, a própria ética profissional, sobre quem está a falar com quem, sobre o quê, e com que objectivo, em nome de um controlo mais eficaz da democracia e respeito pelos princípios democráticos.

Em Portugal, os lobistas profissionais não são numerosos e grande parte da sua actividade é praticada por escritórios de advogados, associações, confederações e agências de comunicação, que visam influenciar os poderes públicos (legislativo e executivo), na defesa dos interesses de quem representam. No entanto, como
não existe qualquer regulamentação, reconhecimento ou suporte legislativo desta prática profissional ninguém se assume, abertamente, que é lobista!

A actividade do lobista e a sua envolvência pode ser vista na faceta de um negociador, intermediário, agente de pressão, e representante de um grupo de interesses organizado em princípio por conta de outrem.

Tem a finalidade de auxiliar, influenciar e orientar, por meios lícitos e com conhecimentos técnicos e de Direito, os decisores e legisladores, das pretensões dos grupos que representam e, por consequência, levará a opções em consciência numa decisão pública e a uma melhor prática política.

A definição de Lóbi, adoptada por Martins Lampreia, é um conjunto de actividades que visam exercer pressão, persuadir ou influenciar, directa ou indirectamente, de forma transparente e legal, sobre os poderes públicos (legislativo e executivo), na defesa dos interesses de uma empresa, sector de actividade ou instituição.

É o que se pode também apelidar de assessoria estratégica de gestão, deveras importante, tanto ao sector público como ao privado.

É uma ferramenta em comunicação estratégica, transparente, legal, um processo planificado, predominantemente informativo, funcionando também como contra-poder do legislador.

O Lóbi tem, por todos os motivos, de deixar de ser uma lacuna no contexto português onde todos são lobistas, mas poucos o assumem, e enquadrada como uma técnica legítima que assenta numa prestação de serviços.

Desmistificar e esclarecer aquela que é, segundo vários autores, a forma mais legítima de exercer pressão, junto dos poderes públicos, na defesa dos interesses da sociedade civil e continuar a fazer caminho para que a profissão de lobista seja de reconhecimento e dignidade. O Lóbi é, nas palavras do Professor Martins Lampreia, a segunda profissão mais velha do mundo.

Neste contexto deixamos algumas questões para reflexão:

  • Qual o objetivo do Lóbi? Influenciar os decisores ?
  • Qual a importância da regulamentação do Lóbi?
  • Deve o Lóbi ser ou não regulamentado ?
  • Tráfico de influências ou não?
  • Quem deve poder fazer Lóbi?

Este debate público “Lóbi em Portugal – Que Futuro?” é também uma homenagem póstuma ao Professor Joaquim Martins Lampreia, que foi um dos poucos portugueses acreditados em Bruxelas, e, publicamente,” o único português que se assumiu lobista. Trabalhou mais de 30 anos no sector da comunicação com a sua actividade profissional focada na consultoria. Um acérrimo defensor da regulamentação do Lóbi em Portugal e do reconhecimento da sua actividade, tendo desde sempre sido esta a sua grande cruzada pessoal.

Nesta sua “luta” pelo reconhecimento do exercício do lóbi, tentou mesmo criar uma associação, o que não veio a concretizar-se por falta de associados.

Foi uma honra, e enorme orgulho, termos sido os seus últimos alunos.

E para terminar dizer que falar de Lóbi, em Portugal, é falar necessariamente de Joaquim Martins Lampreia.

Aftab Tayob
Lídia Mendes
Luís M. Matias
Wenderson Alves

A regulação do Lóbi na visão dos partidos em Portugal

No ano passado, em julho de 2019, a Assembleia da República chumbou o anterior Projeto de Lei que previa a regulação do Lóbi, após o veto do Presidente da República. Os votos contra foram do PSD, BE, PCP e PEV. Os únicos dois partidos a favor foram o PS e o CDS-PP. O deputado do PAN, André Silva, optou pela abstenção.

O PS, segundo o deputado socialista Pedro Delgado Alves, membro da Comissão da Transparência, elogiou o trabalho dessa comissão em 2019, reconhecendo que o pacote da transparência, que acabou chumbado, resultou na “alteração mais profunda e mais abrangente” da legislação.

Já o CDS, que em 2019 votou contra as propostas saídas da Comissão da Transparência, à exceção da que regula o Lóbi, referiu, pela voz da deputada Vânia Dias da Silva, que o Projeto de Lei aprovado, e que acabaria vetado e chumbado, não foi um reforço da transparência, mas sim “da aparência de transparência”.

O PSD decidiu não viabilizar esta lei em 2019, porque, segundo o líder da bancada social-democrata, Fernando Negrão, “trata-se de uma matéria muito sensível, que merece tempo e ponderação e nestas circunstâncias não apresentaremos qualquer alteração e votaremos contra”. Importa mencionar que o PSD começou por ser favorável à regulação do Lóbi. Aliás, o deputado do PSD, Duarte Marques, considerou, na altura, que o Parlamento tinha dado “um passo importantíssimo para a transparência das decisões políticas”, com o intuito de regular a representação de interesses legítimos, ou lóbis. No entanto, a posição partidária modificou-se, principalmente a partir da tomada de posse do atual líder do partido, Rui Rio.

A regulação do Lóbi, para o Partido Comunista, é “particularmente grave”, já que existem atualmente mecanismos de participação democrática previstos na Constituição e nas práticas da Assembleia da República, que permitem a empresas e sindicatos dirigirem-se ao Parlamento, sem que haja regras limitadas para isso. Segundo o deputado comunista António Filipe, no entender do partido, regulamentar o Lóbi não é mais do que “permitir aos grandes escritórios de advogados que prestem mais um serviço altamente remunerado para fazerem lóbi junto da Assembleia da República”.

Marcelo Rebelo de Sousa optou pelo veto ao diploma em 2019, apontando objeções relativamente à obrigação dos lobistas declararem apenas os principais interesses que representam, ao invés de todos, ou o facto da Presidência da República não estar entre os órgãos que ficam abrangidos por estas obrigações de transparência. O Partido Socialista e o CDS-PP mostraram-se recetivos quanto a melhorar a lei, seguindo as indicações dadas pelo Presidente. Contudo será sempre necessário contar com os votos da bancada social-democrata para aprovar uma possível lei do Lóbi.

No início de 2020, um novo Projeto de Lei n.º 181/XIV/1ª, foi entregue pelo PAN na Assembleia da República. Este novo Projeto de Lei tem o intuito de regular a atividade do Lóbi em Portugal, estabelecendo regras de transparência aplicáveis nas relações “entre entidades públicas e outras entidades que, sob qualquer forma, pretendam assegurar a representação dos grupos de interesses” ou lóbis.

Este Projeto de Lei pretende que se adote um sistema de regulação do Lóbi idêntico ao da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu, através de “um sistema integrado de registo único e centralizado”, em que serão as entidades públicas a “reportar mensalmente todas as interações mantidas com lobistas”.

Segundo o PAN, com este Projeto de Lei procurar-se-á garantir o combate aos fenómenos de corrupção e de tráfico de influências e também disciplinar de forma consequente e eficaz, a atividade de “lobbying” ou de representação de interesses no nosso país.

Uma iniciativa como a do presente Webinar sobre o futuro do Lóbi em Portugal, organizada pela Pós-Graduação em Assessoria Política e Comunicação Estratégica da Autónoma Academy, reveste-se de extrema importância, pois contribuirá para o debate em torno desta temática e será um fórum fundamental para voltar a trazer este assunto à discussão pública. Quanto maior for a divulgação e a discussão do tema Lóbi na sociedade civil, maior será também a sua capacidade de penetração no espetro político-partidário nacional, conduzindo a uma discussão séria e aprofundada e a uma possível obtenção de resultados a nível legislativo.

Os alunos da Pós-Graduação em Assessoria Política e Comunicação Estratégica

Graça Iracelma
Maria Ana Lopes
Rodrigo Carrilho
Sidney Dias

Publicado por Pós-Graduação Assessoria Política e Comunicação Estratégica

Autónoma Academy - Universidade Autónoma de Lisboa